Hipinose
Eu sou curiosa. Não sei se aprendi com Alice ou se nasci Alice. Se eu visse um coelho falante com um relógio de bolso, também iria atrás. Mas nunca vi. Só vejo pessoas (vivas). Eu vejo as pessoas e as vezes elas me hipnotizam. Alguma vez, caro leitor, já esteve em algum lugar onde viu alguém que brilhava? Alguém que você não conseguia parar de olhar? Alguém diferente, que parecia uma figurinha colada em um cenário? Eu costumo me deparar com essas pessoas vez ou outra. E não sei parar de olhar pra elas, olhar as manias delas.
Não faço questão de nomes, mas faço muita questão de ideias. Tudo o que eu desejo ali é que aquela pessoa me conte passado, presente e futuro. As vezes acontece, as vezes eu continuo em hipinose, criando meu próprio molde daquela pessoa. Aqui estão alguns dos últimos casos de hipnose:
A fada brava: Eu estava esperando por uma aula de linguagem de programação na faculdade, no fim de tarde. A sala estava vazia e eu estava pintando o meu livro de colorir (Floresta Encantada). E então chegou essa garota, meio loira, com all star e jeans e disse "Por que você fica ai sozinha?". Pensei em responder que estava ali sozinha porque não tinha ninguém na sala, mas não respondi nada. E ela disse "Senta aqui com a gente". Eu não sabia quem era "a gente", mas sentei. Ela parecia uma fada. Agitada, as vezes ficava imóvel olhando pro meu rosto enquanto eu falava, outras vezes os olhos não paravam de se mexer e ela observava tudo muito rápido. O celular dela estava ruim e os avós não paravam de ligar. Ela estava brava, mas não de verdade. Mesmo que fosse de verdade, não parecia. Porque ela só falava rindo. Logo depois eu descobri que "a gente" era um grupinho daquela turma do qual ela fazia parte e todos que chegavam ouviam um "Essa é a Julia" da fada brava.
O rapaz que fumava não um, como dois cigarros: As típicas festas de quem tem entre 19 e 25 anos. Uma casa vazia, cerveja, uns amigos, cigarros. Cigarros. Havia esse rapaz que eu já conhecia, mas conheci de novo nessa noite. Porque ele já não era o mesmo do colegial e tinha cortado o cabelo. E ele ria e todos riam dele. E todo mundo escutava a mesma música, mas ele usou os fones. E todos preferiam a luz apagada, mas ele acendia do nada, sem avisar, machucando nossos olhos. E no fim da noite, quando todos já estavam jogados na sala e a cerveja já tinha acabado, ele resolveu fumar dois cigarros de uma vez só. Lembrei, automaticamente, de alguma cena de filme onde uma garota loira fumava quatro. E enquanto ele tentava acender os dois cigarros eu só pensada "Por favor, coloque mais dois na boca". Ele não colocou. E nem conseguiu acender ali, porque o último fósforo alguém assoprou (o que me fez rir).
O que sabia enfeitar a bicicleta: Quem já esteve na Universidade Federal de Niterói sabe que diversidade é, definitivamente, algo que se encontra por lá. Então eu estava no campus com uma amiga, esperando outra pessoa, tomando um chá. Estava chovendo, aquela garoa fininha e blin blin, um rapaz de bicicleta. Bicicleta de cestinha. Cestinha enrolada com flores brancas. Era meio ruivo, bermuda, bolsa de couro e pedalava sorrindo. Passou uma vez, passou duas vezes. Eu pensei em convida-lo pra mesa na terceira vez que ele passasse, mas então eu deixaria para a quarta vez. E na quarta vez, eu deixaria para a quinta.